A maioria das empresas está habituada a dois tipos de desligamento de colaboradores: a rescisão direta do contrato por justa causa e a rescisão direta do contrato sem justa causa. No entanto, há uma terceira forma: estamos falando da rescisão indireta do contrato de trabalho, que pode ser solicitada pelo colaborador.
Esse direito é resguardado pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e uma opção quando o colaborador, de alguma forma, sente-se lesado no ambiente de trabalho. Ou seja, ela entra em cena quando as regras do contrato de trabalho são quebradas pelos empregadores.
Neste artigo, vamos explicar em mais detalhes o que é a rescisão indireta, como ela é aplicada e quais são os direitos do trabalhador. Se o desligamento humanizado é uma preocupação na sua empresa, não deixe de conferir o conteúdo até o final, para evitar esse tipo de situação. Confira!
O que é rescisão indireta?
A rescisão indireta do contrato de trabalho pode ser definida como um tipo de demissão, na qual a iniciativa de desligamento parte do trabalhador. Na prática, o colaborador pode solicitar esse direito quando o empregador comete alguma infração grave, descumprindo os termos acordados no ato da contratação.
A solicitação também pode ser feita mediante situações que envolvem agressão, humilhação ou atraso de salário. E, mais recentemente, o desenvolvimento da Síndrome de Burnout é mais uma das situações que se enquadram nos motivos para rescisão indireta.
Uma das principais dúvidas sobre o tema é em relação aos tipos de contrato de trabalho nos quais a rescisão indireta se aplica. Para esclarecer esse questionamento, é importante dizer que ela se estende aos empregados registrados no regime CLT.
Contudo, é imprescindível respeitar os direitos e o bem-estar de todos os colaboradores da organização, independentemente de qual seja o regime sob o qual foram contratados.
O que diz a Lei sobre rescisão indireta?
Conforme determinado no Artigo 483 da CLT, o trabalhador tem o direito de solicitar a rescisão indireta nas seguintes circunstâncias:
- ”forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato”;
- ”for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo”;
- ”correr perigo manifesto de mal considerável”;
- ”o empregador não cumprir as obrigações do contrato”;
- ”o empregador, ou seus prepostos, praticar contra ele, ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama”;
- ”o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”;
- ”o empregador reduzir o trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários”.
Para tirar suas dúvidas, vamos detalhar as características de cada situação que pode gerar rescisão indireta de contrato. Acompanhe.
Atraso no pagamento do salário
Quando contrata um colaborador legalmente, o empregador assume o compromisso de pagar o salário dele, na quantia e dentro do prazo acordados. No geral, a data de pagamento é definida até o quinto dia útil do mês.
A empresa é obrigada a pagar o salário mensalmente e dentro do prazo estipulado. A lei é flexível somente quando se trata de gratificações, comissões ou porcentagens.
O não pagamento ou o atraso no calendário de pagamentos dá ao colaborador o direito de rescindir o seu contrato de trabalho de forma indireta.
Rebaixamento de função ou salário
Toda a empresa possui um organograma, que é a definição das posições hierárquicas ocupadas no ambiente de trabalho.
Cada cargo tem funções e remuneração específicas, sendo que, ao longo do tempo, o colaborador pode ser promovido, porém, jamais pode ser rebaixado na escala de trabalho ou ter seu salário reduzido.
Portanto, se a organização contratou o profissional para ocupar um determinado cargo hierárquico e, posteriormente, o rebaixou de função ou reduziu a sua remuneração, também cabe a solicitação de rescisão indireta.
Constrangimento e assédio moral
Um ambiente de trabalho tóxico abre brecha para a aplicação da rescisão indireta e processos trabalhistas. Pode ser entendido como assédio moral quando o empregador:
- desfere ofensas ou ameaças, ou provoca situações constrangedoras para o empregado;
- contribui para a criação de um ambiente que afeta negativamente a dignidade, personalidade e honra do colaborador;
- utiliza palavras, gestos, atitudes ou comportamentos que firam a integridade psíquica ou física do contratado.
Agressão física
Agressões físicas ou verbais por parte do empregador são inadmissíveis. Diante desse tipo de situação, fica resguardado ao colaborador o direito de rescisão indireta. Em caso de o empregador agir em legítima defesa, a ação é considerada proporcional.
Desvio de função
No contrato de trabalho estão descritas as funções que o colaborador vai desempenhar.
Contudo, há casos em que o empregador descumpre esse acordo, fazendo com que o colaborador seja submetido ao excesso de trabalho em decorrência de novas funções não informadas no ato da contratação, à realização de tarefas não compatíveis com a sua formação ou competências técnicas, e ao trabalho que requer esforço físico além da sua capacidade.
Em todas as circunstâncias citadas acima, o colaborador poderá pedir a rescisão indireta do vínculo de trabalho com a empresa.
Não fornecimento de equipamentos de proteção
É responsabilidade do empregador oferecer Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para colaboradores que realizam atividades de risco.
A empresa que não fornece EPIs adequados ao trabalhador está colocando a integridade física dele em risco — fator que também pode ser utilizado com base para um pedido de rescisão indireta.
Como as doenças psicossociais se relacionam com a rescisão indireta de contrato?
As doenças psicossociais são aquelas que podem ser desencadeadas devido ao ambiente em que o indivíduo convive. Entre elas estão ansiedade, depressão e síndrome do pânico.
Se essas doenças são provocadas no ambiente de trabalho e causam o esgotamento físico e mental do colaborador, o seu quadro de saúde pode ser caracterizado como síndrome de Burnout.
Da mesma forma que acontece na depressão, quem sofre dessa condição pode apresentar ansiedade a ponto de não dormir bem à noite e falta de motivação para trabalhar, o que é comum entre pessoas submetidas a situações extremas de trabalho.
Além disso, determinação de metas e prazos que não condizem com a realidade, sobrecarga de trabalho e cobranças excessivas, que fazem com que o colaborador esteja sempre sob pressão, são frequentemente relatadas como fatores desencadeadores da Burnout.
O diagnóstico de síndrome de Burnout em si não dá direito à rescisão indireta. Todavia, se o colaborador conseguir provar na Justiça que o desenvolvimento da doença está associado a condições de trabalho que ferem as leis trabalhistas, poderá pedir o cumprimento deste direito.
Como a rescisão indireta é aplicada?
Para que a rescisão indireta seja aplicada, o colaborador precisa contar com um advogado e reunir provas que justifiquem o pedido desse tipo de rescisão. É possível utilizar vídeos, prints de mensagens trocadas, fotos e ainda contar com a colaboração de testemunhas. Após essa fase, é preciso aguardar a validação do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Mais detalhadamente, o processo de rescisão indireta só tem início quando o trabalhador comunica o empregador ou o departamento pessoal do RH da empresa por meio de seu advogado. Caso isso não aconteça, e o colaborador não compareça mais ao seu posto de trabalho, a empresa pode considerar abandono de emprego.
Uma vez que é comunicada, cabe à empresa entrar em contato com o advogado do trabalhador, de preferência a partir do seu representante jurídico, para lidar com a ação de rescisão de contrato.
O documento que representa a rescisão de contrato será entregue ao TST, informando as razões que justificam a solicitação de rescisão indireta e os pagamentos que devem ser feitos ao colaborador.
Somente após o parecer favorável para a rescisão indireta do Tribunal o colaborador é definitivamente desligado da organização.
Esse órgão vai julgar o mérito da questão e, caso dê um parecer favorável, o empregado é desligado da empresa em definitivo.
Quais são os direitos do trabalhador na rescisão indireta?
Ao solicitar a rescisão indireta do contrato de trabalho, o colaborador partilha dos mesmos direitos de quem é demitido sem justa causa.
Isso quer dizer que ele pode receber o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), o que inclui a multa de 40%, aviso prévio, indenizado, seguro-desemprego, férias e 13.º proporcionais. Abaixo vamos abordar esses direitos de forma mais aprofundada.
FGTS incluindo a multa de 40%
Um colaborador que está insatisfeito com o seu emprego e decide pedir demissão voluntária perde parte dos seus direitos. Entre eles está a indenização de 40% sobre FGTS.
Mas se o empregado solicita a rescisão indireta e esse direito lhe é concedido, ele continua tendo direito a receber a indenização de 40% sobre o FGTS, paga pela empresa.
Seguro-desemprego
Os empregados que têm a rescisão indireta aprovada podem receber o seguro-desemprego. Para isso, devem atender aos seguintes requisitos:
- ter recebido salários consecutivos nos 12 meses que antecedem a rescisão indireta;
- estar inscrito no PIS/PASEP no período mínimo de 5 anos;
- não ter recebido seguro-desemprego nos últimos 16 meses;
- não ter outra fonte de renda para se sustentar.
O número e o valor de parcelas do seguro-desemprego que serão pagas ao ex-colaborador dependem do tempo de serviços prestado por ele e do valor da sua remuneração em contrato.
Aviso prévio indenizado
O aviso prévio é um direito tanto do empregador quanto do empregado, tendo como objetivo permitir que a parte que foi comunicada do término do contrato tenha tempo para se preparar para o desligamento.
Diante de uma rescisão indireta, o colaborador não é obrigado a cumprir o aviso prévio. Assim, a empresa é obrigada a arcar com uma indenização correspondente ao valor do salário que seria pago no período de aviso prévio que seria cumprido.
Férias proporcionais
O recebimento das férias proporcionais é um direito dos colaboradores demitidos sem justa causa e que ainda não completaram um ano de contrato para ter direito às férias integrais.
As férias proporcionais representam 1/12 avos do salário pago ao colaborador mensalmente, mais um acréscimo de 1/3 definido como abono constitucional. Elas também se aplicam à rescisão indireta, desde que o colaborador tenha trabalhado, no mínimo, 14 dias no mês em que o vínculo de trabalho foi encerrado.
Décimo terceiro proporcional
O décimo terceiro é um direito concedido aos colaboradores que trabalham durante um ano completo para a empresa. Em situações em que o colaborador se desliga da organização a partir da rescisão indireta, também terá o direito de receber o décimo terceiro proporcional, que corresponde aos meses trabalhados no ano.
A rescisão indireta do contrato de trabalho gera despesas imprevistas, afeta o seu fluxo de caixa, traz a necessidade de realizar novos processos seletivos, além de manchar a imagem da empresa enquanto marca empregadora e, consequentemente, prejudica o seu crescimento. Para evitar esse problema, é fundamental adotar políticas de motivação e valorização de seus colaboradores, construindo um clima organizacional positivo para a atração e retenção de talentos.
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